A nova reforma da Previdência, mais enxuta para driblar a forte resistência no Congresso, mantém as regras que igualam o trabalhador assalariado rural ao urbano, a despeito de o primeiro começar a trabalhar bem mais cedo e em condições adversas.

O governo recuou em pontos polêmicos da reforma, inclusive nas normas que exigiam contribuição individual de agricultor familiar, o que levaria à exclusão de mais de 10 milhões de trabalhadores da Previdência. Também decidiu aliviar o tempo mínimo de contribuição para trabalhadores assalariados, mantido em 15 anos.

“Eles tinham que vir até aqui ver o duro que é”

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Mas a idade mínima para a aposentadoria vai subir para o trabalhador assalariado rural, já que o texto não prevê distinção em relação ao urbano. De 55 para 62 anos no caso das mulheres e de 60 para 65 entre homens. A alteração continua prevista no artigo 201 da nova versão da reforma.

“A reforma continua sendo excludente para o campo; o governo não mudou a regra que equipara a idade mínima do trabalhador assalariado rural a do urbano, não reconhece mais o trabalho no campo como penoso”, afirmou o especialista Evandro Morello, assessor jurídico da Confederação dos Trabalhadores Agrícolas (Contag).

A Secretaria de Previdência não comentou as regras da reforma após as mudanças anunciadas na semana passada. Na ocasião do texto aprovado em maio pela comissão da Câmara, o órgão confirmou que a reforma igualaria trabalhadores assalariados rurais a urbanos, mas ressalvou que haveria distinções na fase de transição.

Segundo estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 78% das pessoas ocupadas na zona rural começam a trabalhar com até 14 anos, enquanto nas cidades este indicador não passa de 45%.

                                                                                                   Creative Commons/Cícero R.C. Omena

Além de começar a trabalhar mais cedo, o trabalhador rural é mais propenso a desenvolver problemas de saúde. Os pesquisadores Alexandre Arbex e Marcelo Galiza, do Ipea, destacam que a média de trabalhadores que declararam dor na coluna para a realização de atividades habituais é bem superior entre ocupados rurais: 42,9% entre rurais e 29,8% para urbanos, considerando a faixa etária de 30 a 64 anos.

Também se torna mais difícil contribuir para a Previdência por muitos anos quando o trabalho não é contínuo. A informalidade beira 60% da força de trabalho do setor agrícola, segundo a pesquisa por amostragem de domicílio do o IBGE. Dos 13 milhões de trabalhadores rurais, cerca de 40% atuavam por conta própria e aproximadamente 18% sem-carteira, enquanto os empregados com carteira somam minoria da ordem de 4,5%. Pessoas ocupadas no próprio consumo e não remuneradas respondem por 25% e 11% respectivamente.

“A persistência do alto grau de informalidade, elemento estrutural do mercado de trabalho rural, e a preponderância de formas de contratação temporárias no campo, autorizadas pela legislação trabalhista, impedem que os empregados rurais tenham acesso à proteção previdenciária”, afirmam os pesquisadores do Ipea.

Segundo eles, quase todos os benefícios concedidos no campo são realizados via segurado especial porque a comprovação de vínculo do trabalhador assalariado, sazonal, é difícil de ser feita.
O fortalecimento da cobertura previdenciária nos últimos anos, segundo o Ipea, reduziu o fluxo migratório da zona rural para as grandes cidades.

“Os recursos distribuídos por meio do sistema previdenciário rural (…) funciona como importante indutor da permanência das famílias do campo, reduzindo o ritmo das migrações para a cidade”, concluem os pesquisadores do Ipea.

Os pesquisadores do Ipea respaldam a importância à Previdência: os benefícios do INSS reduziram um terço da pobreza no campo nos últimos anos.